domingo, 15 de novembro de 2009

LORCA, O CORAÇÃO DO TEMPO




Com a lua de junho, o estaleiro da casa natal de Lorca em Fuente Vaqueiros, que serve como local para exposições, se transformou.Saíram os desenhos do poeta e sobre o poeta que preechiam o espaço no ano passado, em comemoração aos 80 anos do Romanceiro Cigano e inicia-se outra instalação, tão efêmera, ou ao contrário, tão permanente com as múltiplas interpretações do tempo na obra lorquiana. A única presença da mostra é a PALAVRA e a imagem do poeta, desenhados em um círculo em constante movimento, nunca silencia, começou em 5 de junho e há 111 anos e continuará ecoando e dando seus frutos . Seu tempo, seus tempos , para nós, sempre no vivo presente, potencia o desejo de seu eterno retorno. Lorca ,sua obra, sua sensibilidade, atravessou as fronteiras do tempo convertendo num sonho infinito.
Nesta mostra, montaram um deserto, com dunas e os relógios derretidos de Dali, donde emergem espinhos , ou ervas coloridas em meio aos quais são sustentadas as palavras e a poesia de Lorca.Ao atravessar o deserto do tempo de Lorca, caímos no tempo do nosso deserto.

A SELVA DOS RELÓGIOS

Entrei na selva
dos relógios.

Frondes de tique-taque,
cachos de sino
E, sob a hora múltipla,
constelações de pêndulos.
Os lírios negros
das horas mortas,
os lírios negros
das horas meninas.
Tudo igual!
E o ouro do amor?
Há uma hora tão somente.
Uma hora tão-somente!
A hora fria!

Por aqui hás de passar,
coração!
Por aqui ,
Coração!

A verdadeira esfinge é o relógio.
Os relógios nos trazem os invernos.
A madrugada têm um preamar de relógios.

Quando será o crepúsculo
de todos os relógios?
Quando essas luas brancas
se fundirão pelos montes?
Sentei-me
num claro do tempo
Era um remanso de silêncio,
de um branco
silêncio.

O tempo
tem cor da noite.
De uma noite quieta.
Sobre luas enormes,
a Eternidade
está fixa nas doze.
E o tempo adormeceu
para sempre em sua torre.
Enganam-nos
Todos os relógios.
O tempo tem já
   horizontes.

Soou a hora na selva!
Os relógios de bolso,
como enxames de moscas,
iam e vinham.
Em meu coração soava
o relógio sobredourado
de minha avozinha.

HORA DE ESTRELAS

O silêncio redondo da noite
sobre o pentagrama
do infinito.
Eu saio desnudo para a rua,
maduro de versos
perdidos.
O negror, crivado
pelo canto de grilo,
tem esse fogo-fátuo,
morto,
do som.
Essa luz musical
que percebe o espírito.
  Os esqueletos de mil mariposas
dormem em meu recinto.
  Há uma juventude de brisas loucas
sobre o rio.


Fotos: Fabrico Matheus
Fonte :Obra poética completa Federico García Lorca

Nenhum comentário:

Postar um comentário