segunda-feira, 18 de março de 2013

ENVELHECER SEM DOR








"Se a vaidade lembrasse da palavra envelhecimento, ela correria para os braços da sabedoria!"Reinaldo Ribeiro


Um dos objetivos primeiro da prevenção  diagnóstica é antecipar de modo que  se evite o dano, ou que se impeça que o “mal“ se instale.
O envelhecer é condição “sine qua non” do viver; assim , a prevenção adquire um caráter de melhorar o processo e não se  evitar. Os estudos da longevidade, mais que prolongar a vida, objetivam a melhoria desta qualidade no envelhecimento.
Segundo estudos da ONU, o mundo terá um bilhão de idosos em dez anos, é preciso correr contra o tempo e adotar medidas que assegurem , desde já , o bem-estar da população- que fica mais velha a cada dia.  
O que a medicina preventiva busca é melhorar esse longo período ruim pelo qual se passa na velhice.
Hoje a ciência conhece as moléculas capazes de aumentar a longevidade de mamíferos, cada vez mais,  a chance de se chegar a uma droga que aumente a vida do ser humano é enorme. Todos buscam  encontrar a fonte da juventude, o problema é que  a velhice têm um custo muito alto. Desde os convênios médicos que aumentam vertiginosamente os preços acima dos 60 anos , até aos serviços de cuidados com os idosos que são de elevado valor.
Todos esses fatores são impactantes do ponto de vista social e econômico para a sociedade, que precisa se reorganizar, desde pequenos ajustes como manter um trabalho para esta população idosa e o trabalho para os jovens. Uma mudança global têm que acontecer para se adaptar aos progressos da medicina e da prevenção da saúde.
O trabalho da ciência preventiva do envelhecimento trabalha com a percepção de tempo para melhorar a qualidade do processo, assim o corpo passará a viver com um “tempo” que não corresponde ao real e com uma maior longevidade.
Todos temos a “fantasia “da imortalidade, de encontrar a fonte da juventude. Sabe –se  já fatores que prolongam a vida, como restrição calórica, restrição a ingestão de álcool e fumo. Por outro lado a restrição calórica está ligada a redução da fecundidade e reprodução. Se o ser humano não se reproduz ele está morto geneticamente. Toda esta discussão inicial têm aspectos fisiológicos , mais que estéticos. Por outro lado, quando se trata da longevidade com saúde, descobre-se que ficamos mais jovens, mesmo que este aspecto não seja fundamental aos pesquisadores.
A estética não melhora a longevidade, apenas melhora a aparência, o quê têm a sua importância psíquica, por que quanto mais nos sentimos bem, mais saudáveis  estamos.
Envelhecer é muito difícil para todo mundo. Temos que aceitar que vamos aos poucos perdendo nossas características físicas, E mais: envelhecer dói. Descobrimos certas dores em locais que antes sequer imaginávamos existir.
Quando visitamos os idosos e perguntamos como é ser velho, a resposta em quase 100% dos casos – é “dói , todo dia dói”, não só a dor física , mas a dor da perda dos seus , de sua geração. Ao envelhecer, é psiquicamente  essencial aceitar ajuda. As vezes, a idéia de que precisamos de alguém , não é suportável. A solidão é um fator que aumenta esta dor do envelhecer. O que se nota é que as pessoas estão envelhecendo sozinhas e morrendo sozinhas. O envelhecer com saúde precisa de uma conexão ampla entre setores e disciplinas diversas da área da saúde e um suporte político-social.
Estas questões são fundamentais para mim enquanto médico e enquanto indivíduo. Elas rondam o meu dia –a-dia na clínica e na minha própria mente, corpo e no espelho todas as manhãs.
Às vezes , como aconteceu recentemente, foram passageiras e alertaram-me para a importância da prevenção. Antes de ser médico, sou um ser humano. E a prevenção se dá numa relação médico-paciente e não numa relação em que o médico seja médico de si mesmo.
O fato é que próximo ao meu aniversário, o que já se pensa em tempo e anos sem querer pensar, notei que estava ficando um pouco surdo do ouvido direito. Minha visão para perto estava pouco-a –pouco piorando e as letras se embaraçavam num borrão indecifrável.
Por quê comigo? Procuro seguir uma dieta, mesmo que às vezes abuse do vinho, mas o vinho faz bem ao coração e a alma.Faço ginástica, alongamento, spinning, meditação, tudo que leio e informo para que tenha uma vida saudável apesar dos pesares  da rotina .
Aconteceu que no dia do meu aniversário passei à beira-mar, nadei e me dei o ócio de presente.
Voltei para casa mais surdo, marquei o otorrino, mas no afã da cura e na ansiedade dos sintomas, fui me tratando e ficando cada vez mais mais surdo. Mais velho, mais surdo e mais cego.
Meu avô paterno ficou surdo, será que esta surdez seria genética. Outros exames, como os cardíacos e sanguíneos deram todos normais. E para completar meus suplícios, apareceu uma pinta próximo ao sulco naso-labial, o que poderia ser? Já me vi na descida da montanha da vida , mas de forma avassaladora:- uma assustadora avalanche rumo ao fim, um drama!
A surdez evoluíu com dor e tive que procurar um atendimento de urgência. Meu colega médico deu-me uma bronca com meu uso excessivo de cotonete. Fez uma lavagem do  canal auditivo e em 5 minutos, ouvia o silêncio.
O oftalmologista que é meu xará, viu na minha ficha que minha última visita ocorrerá há 5 anos. Eu ,por conta própria fui aumentado progressivamente o grau de minha lente e hiper-corrigi minha miopia, presenteando-me com uma  hipermetropia e presbiopia. Voltei aos graus anteriores e enxergar novamente de perto .
No dermatologista, a pinta que eu pensará  pode ser até um pequeno tumor , era somente uma espinha mal cicatrizada pelo barbear. Mas o colega, mencionou que o meu rosto estava caído , e que seria “legal” fazer um pequeno preenchimento para suavizar minhas marcas do tempo. Nada muito exagerado, e nada que comprometeria as minhas feições, iria ficar mais jovem e atraente. O tempo, este mesmo que esculpira  as marcas em minha face, ensinou-me a ouvir e me fazer de bobo, ou seja, não precipitar. Sentir as minhas próprias necessidades. Isto não descarta que num futuro possa vir a fazer um “lifting “facial, mas a necessidade estética , principalmente entre colegas, têm que partir do paciente, e no caso percebi que era algo precipitado e mais comercial que uma ajuda médica no sentido mesmo que estético. Claro que fiquei com a pulga atrás da orelha  e fui ao espelho assim que cheguei em casa.
Estando agora saudável, em todos os sentidos. Ouvindo e enxergando tudo, o espelho   avisou-me que ainda não é o momento de se preencher nada. Mas se continuasse com a pulga atrás da orelha , procuraria a opinião de outro colega especialista antes de precipitar-me no terreno movediço da eterna juventude prometida pela medicina estética. Sem críticas a qualquer profissional, e sem “mea-culpa de que certamente farei uso um dia. Mas  nesta área a parcimônia deve imperar para que  o resultado buscado seja o mais próximo do  imaginado.
Assim, eu que sou e não nego , extremamente vaidoso, depois destes episódios pequenos , mas que  me ensinaram a importância da prevenção com profissionais/colegas, e passado mais um ano de vida. Acordei mais velho, mas com mais saúde e com vontade de viver o hoje como se não houvesse o amanhã.
Com minha extrema esperança e olhar, sinto-me profundamente tocado pelos que envelhecem com suas dores e nos presenteiam com uma vivacidade de fazer inveja aos jovens. Principalmente nas artes, recentemente na montagem de Edipo -Rei no Sesc -Belenzinho:-  Amir Haddad, Rogério Fróes, Pietro Mario faz toda a diferença. O Quarteto dirigido por Dustin Hoffman é outro feliz exemplo. Beatriz Pimenta Camargo de 81 anos como nova diretora do MASP. Fernanda Montenegro, Cleide Yaconis, Lima Duarte,  Sebastião Salgado, toda a geração de músicos de Gil, Caetano, Tom Zé, Zé Celso, Antunes Filho, meu pai, minha mãe ... e tantos outros...  e cada vez mais os da "melhor idade"  nos  ensinam a viver mais e melhor... 


Fonte:Entrevista com o geneticista especialista em envelhecimento Hugo Aguilaniu da École Normale Supérieure de Lyon.

Foto:Fabricio Matheus