"A compaixão pelos animais está intimamente
ligada a bondade de caráter, e pode ser seguramente afirmado que quem é cruel
com os animais não pode ser um bom homem”
“Desde jovem, percebi que os outros lutavam por bens
exteriores, o
que não me interessava, pois eu tinha dentro de mim um tesouro
muito mais valioso do que todas as posses materiais. O mais importante era
aumentar esse tesouro, bastando desenvolver a mente e ser totalmente livre.
(...)"
Ontem fui cuidar do meu coração. Passei de médico a
paciente. Cheguei meia-hora antes do horário agendado, conforme enfatizara na
marcação. A recepcionista foi muito simpática, principalmente quando o convênio
que aumentou há um mês não quis liberar o exame que fiz há um ano.
Só depois de dizer que apesar de não ser hipertenso, tinha
extra-sistoles e taquicardias quando estressado e um discreto refluxo
mitral, mesmo já tendo confirmado que na
minha família todos morrem do coração, que
minha mãe é chagásica com um coração enorme e meu pai hipertenso desde
que nasci, escutando o dialogo da recepcionista com o convênio:-
-
Por quê o Dr. Fabricio pediu este exame para o
paciente Fabricio.
-
O paciente Fabricio é o Dr. Fabricio.
-
Não o meu médico não sou eu, estou pedindo os
exames para adiantar.
-
Tudo bem doutor! Sim é o Dr. Fabricio que pediu
o exame para o Dr. Fabricio.
-
Nossa mais ele é médico! A família morre do
coração, sim senhor . A mãe têm problema . O pai é hipertenso desde que ele
nasceu.
-
Ele quando estressado disse que têm extra... extra sís....tooo.....leeeee.
-
Ah!Não sei , pergunta para ele?
-
É taquicardia, isso é , o coração acelera....
-
Calma Doutor!
-
Claro que ele está ficando nervoso!
-
Viu!Liberaram... mas é o fim... até para médico.
E eles não eram assim, não sei o que está acontecendo com estes convênios!
-
O Sr. Pode aguardar.
Um rapaz chamado Everton, cujas colegas as
sós, chamavam carinhosamente de Biii, veio me conduzir aos exames.
A técnica do eletro, não respondeu ao meu
Boa Tarde, como uma policial ordenou: - Tira a camisa e deita. Falando sem
parar com a mocinha que estava no computador, reclamava sobre o salario e o não
pagamento das horas extras enquanto colava os eletrodos, depois afirmativamente
decretou:
-
Acabou, veste a camisa e vamos para o Eco.
Na sala do Eco, o médico- colega, também
não respondeu ao meu cumprimento de Boa Tarde. De costas estava e de costas
ficou. A mesma técnica com os cabelos cobreados ordenou novamente: _ Tira a
camisa e deita, vira de lado para o doutor e braços para cima.
O meu colega, não olhou nos meus olhos,
começou o exame fixo na tela, e como um robô, carimbava VE, VD, AE, AD, VM, VT.
Fiquei tão constrangido , que fui inflando
o meu coração e a tela apagou.
Ele tossiu, pediu desculpas e disse que era
pelo ar-condicionado.
Ligou novamente o aparelho, mas as imagens
de meu coração se perderá no meio de tantos outros corações.
Vamos ter que repetir o exame. Tudo bem,
não tenho pressa...
E
novamente , mudo carimbava VE, VD, AE, AD, VM , VT. .. Eu via meu sangue , minhas
válvulas, mas ele não dizia nada. .. e na eternidade do seu silêncio, bradou
afônico:- acabou.
Eu fiquei tão constrangido , e com pena do
meu colega que desisti de perguntar como estava meu coração. Mesmo que morresse
ao cruzar a porta, ele certamente estava melhor que o dele.
Ainda agradeci, mas nada. Só a técnica de
cabelos cobreados recente, novamente ordenou como uma policial: Pode vestir e
ir para o RX.
Mesmo quando estressado, com minhas
taquicardias e extra-sistoles , quando estou médico, jamais deixo de ser
profissional. Sempre recebo com um cumprimento, falo sobre o que esta
acontecendo e dou um parecer. Jamais tive meu coração examinado com tanto
silêncio, mesmo quando o mesmo se fazia necessário numa ausculta com
estetoscópio, ainda assim, eu escutava junto com o ritmo e respiração, um
alento do colega-médico.
Mas fiquei tão desconcertado com a fria
recepção que me deu vontade de pedir para abraçar meu colega. Encostar sua
cabeça no meu ombro e perguntar:- Está tudo bem com você? Olha nos meus olhos.
Esquece os médicos cubanos. Existe amor em SP. Meu, vai também para o Butão!
Têm tantos lugares o mundo... Faz teatro
com o Zé Celso...mas o meu colega-médico no seu silêncio confirmou o que eu já
vinha observando. Temos muito a aprender com os animais. Nunca ninguém sentiu tanto
a minha falta como o meu cachorro Otto. Ele que já é magro, ficou mais magro,
melancólico. E só depois de uma semana comigo voltou a ser o mesmo Otto. E é
por isso , que mesmo não sabendo nada de como está meu coração, eu torço para
que ele esteja bem, por quê no ano que vêm, eu vou atrás da natureza e dos
animais. Vou para Galapagos, Antartica, Groelândia, cruzar o círculo Polar, quero me misturar aos pinguins, focas, baleias
, leões marinhos, tartarugas gigantes, lagartos e outros repteis... por quê
certamente irei aprender muito sobre como ser mais humano, mesmo que eles não
falem comigo, certamente olharão no fundo dos meus olhos de verdade.
Como sempre diz uma velha tia, se deixar o
Fabricio , ele vai para a Lua. Ela têm razão , isso se eu não morrer antes do
coração...
Arte:Fabricio Matheus