segunda-feira, 8 de novembro de 2010

QUEM TEM MEDO DE CURUPIRA?


Eu felizmente nasci rodeado de lendas. No corredor de minha casa de infância, os quadros eram de amazonas voadoras, noites enluaradas, mãe d’águas. Minha avô Alzira, exímia cozinheira e contadora de histórias, trabalhou na fazenda de um inglês que atravessou o atlântico e veio se estabelecer perto da região das cabaças. Na sua travessia pelo novo mundo além de trazer tiaras de diamantes , vestidos de fio de prata... cruzou com sereias cujos cantos afundavam navios encantando os homens que tinham tampar os ouvidos para escaparem de seus encantos.Lendas de diamantes que rolavam como fogo brilhando nas correntezas dos córregos. Muita morte pelas pedras preciosas, muita traição. E os lobisomens, tinha certeza que o senhor que morava no final da rua ainda de terra era um... E os tesouros escondidos nas moelas das galinhas que usava nos seus cozidos.Quantas histórias....
As histórias de minha avó se misturavam as histórias de minha mãe, que se misturavam nas histórias lidas, entre elas : o encantado mundo de Monteiro Lobato no Sítio do pica-pau amarelo, povoado de sacis, mulas-sem-cabeças, cucas, boitatás e outros seres fantásticos e lendas do nosso folclore.Todo esse mundo encantado e cheio de mistério, lúdico povoa minha imaginação até hoje.Ali , aprendi como caçar sacis, que vêem nos redemunhos. Já vi a Iara com seu espelho e sua cauda prateada , já escutei o uivo do lobisomen em noites de lua cheia e ouvi o relinchar de mulas sem cabeças e as pegadas do curupira.
O folclore e um gênero da cultura de origem popular, constituída pelos costumes e tradições populares transmitidos de geração em geração.As lendas são narrativas fantasiosas transmitidas pela tradição oral através do tempo.Tudo isso é parte da rica cultura brasileira,repletas de lendas criativas e instigantes.
E esse encantamento me levou a assistir a montagem infanto –juvenil escrita e com direção musical de Zeca Baleiro :Quem tem medo de curupira, em cartaz no teatro Sesi.
Desacreditados e com o orgulho ferido, Saci, Caipora, Boitatá, Curupira e Iara resolvem-se aventurar numa viagem até a cidade , para tentar descobrir porque as pessoas deixaram de crer na sua existência. Apesar da dramaturgia ser um pouco solta, podendo sugerir muitos significados e leituras, como diz o autor:”Entre todos fico com o mais banal e precioso—o sonho, a imaginação , o encantamento, raros no mundo. Por isso tão necessário”.
A simples menção do nome destes duendes das matas , já desperta a curiosidade do público.As aventuras costuradas com música rock, pop e rap da melhor qualidade, com direção geral de Débora Dubois e concepção de Duda Arruk, responsável pela direção de arte e cenografia, construída com sucatas de automóveis e com projeções luminares e a iluminação de Wagner Pinto, que promovem um colorido especial para despertar a atenção dos jovens , hoje tão entretidos com seus celulares e i-phones.
Ótima música como já falei, ótimos atores , com destaque sempre para Danilo Grangheia nos papéis de Serra Madeira, Jacarandá e Índio.
Quem tem medo de curupira é um presente para São Paulo, tão metropolitana, tão selva de pedra. Como é dito no programa: a peça nos faz refletir sobre a brasilidade e a intersecção entre a vida na mata e no meio urbano. Um forma fresca de ver o país . Um ótimo espetáculo que cumpre a função primordial do teatro: A transformação que os seres fantásticos da mata sofrem quando deparam com o desconhecido se fará em nós.

Fotos: João Caldas de divulgação do espetáculo.



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