“Na verdade, na verdade vos digo que, se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, fica ele só;mas se morrer, dá muito fruto.”Evangelho segundo João 12:24
Estas palavras então gravadas na lápide de Dostoiévski( 1821-1881), no monastério Nevsky em São Petesburgo. Versos que serviram de subtítulo para seu último romance , Os Irmãos Karamazov, considerado por Freud o melhor romance já escrito. Sua obra teve uma influência decisiva sobre toda a literatura do século XX, especialmente no expressionismo e existencialismo.
Para Nietzsche , o autor foi o “único psicólogo com quem tenho algo a aprender : ele pertence às inesperadas felicidades da minha vida”. No Brasil sua obra se popularizou principalmente pelas traduções francesas e influênciou entre vários escritores , Machado de Assis, principalmente por despertar no leitor este mergulho na alma humana.
Dostoiévski , cuja escrita encarnam valores atemporais, temas universais, como a morte, suicido, orgulho, destruição dos valores familiares...Sempre com visões sob diferentes ângulos e repletos de uma força dramática, em que os personagens e os opostos pontos de vista são realizados livremente, em violenta dinâmica. Os fatos aparecem de repente, o instante ganha o tempo, as cenas aparecem e desaparecem como num filme, como numa peça de teatro.
A Dócil, novela do autor escrita em1876, está em cartaz no Galpão do Folias, com dramaturgia de Dagoberto Feliz e Pedro Mantovani. Direção de Pedro Mantovani com Dagoberto Feliz e Patrícia Gifford.
A história é a do envolvimento amoroso do dono de uma casa de penhores, homem mais velho, com uma adolescente de 16 anos, com quem se casa e trava uma batalha silenciosa, submissa , opressiva , dia a dia, culminando em uma tragédia.
A novela lida poderia ser uma análise do narrador sobre o fato, que nós é contada com a atuação visceral de Dagoberto Feliz, em meio ao cenário caótico da dupla dos adaptadores, iluminação de Aline Santini e trilha musical de Demian Pinto que faz total diferença.
A história, se você não soubesse, poderia ter sido escrita por Machado de Assis ou até mesmo Nelson Rodrigues.Entremeado a narrativa dos fatos ocorridos, a música entra com a mesma força dramática das ações que nos são apresentadas, num leque que mescla do Tango a Beethoven , de Herivelto Martins, passando por Roberto Carlos e terminando com Chico Buarque e Tom Jobim.
Dagoberto e Patrícia dissecam a alma dos personagens e nos mostram os horrores e misérias da alma humana.De algo, que de certa maneira, esta escondido em cada um de nós. Assistindo a arrebatadora apresentação não têm como não nos redimirmos de nossa pequenez, de nossa finitude. A grandeza da apresentação têm a mesma força transformadora das palavras do autor russo.Talvez mais do que isso, hoje em que a imagem é tão mais forte que a escrita, a peça e o teatro trazem para o público o drama na forma tridimensional.É imperdível.
Fiquei arrebatado pela história, pelas músicas.Muitas fizeram parte de minha infância , e as conheci pelo meu avô , que adorava a Dalva de Oliveira e a Ângela Maria, outras pelo meu pai e outras que escutei no LP dos Doces Bárbaros com a Bethânia, que quis ver mais o Dago.
O Galpão Folias foi um aprendizado na minha vida durante a temporada do El dia em que me Queiras. Fiz amigos e quase uma família ali. Aprendi muito sobre o teatro, a dedicação do ofício com os atores.Entre eles o Dago, que será para sempre o meu Gardel, ainda me lembro claramente de suas falas na peça.
Ficava horas vendo e aprendendo sua rotina com a maquiagem, o cuidado com os instrumentos musicais , com o vestuário dos personagens, o aquecimento vocal era uma festa (séria!). Diverti muito com suas histórias, aliás muitas... Neste período, o Dago estreou Palhaços na sessão da meia-noite e assisti a primeira noite.Depois a temporada foi para outro teatro e quando terminava o El dia , o Dago saía de moto com o acordeon pendurado às costas, rumo ao outro teatro para apresentar Palhaços.
Novamente, reencontrei antes do Palhaços , o Dago na pele do Dago no sagão do teatro Imprensa.Conversamos e revi Palhaços , acho que depois que se passaram 5 anos, algo de Lorca .
Palhaços, de Timonchenco Wehbi(1943-1986) é uma peça de 1974, sobre um duelo travado nos bastidores de um circo decadente , entre um palhaço profissional e um outro palhaço da vida, com diálogos ríspidos, rápidos, outra história sobre o absurdo da existência humana.
Dagoberto Feliz dividi o palco com o não menos sensacional Danilo Grangheia, com direção de Gabriel Carmona.Se a peça está em cartaz ao longo destes anos, não é preciso escrever mais nada,se você não assistiu , não perca.
Quero escrever sim, como a peça fluiu e evoluiu ao longo dos 5 anos. Na primeira noite, lembro-me que o final foi abrupto. Danilo, sempre grande, estava mais técnico e era mais voz,e que voz. Passados 5 anos, o que presenciei foi um feliz casamento que só evoluiu para melhor. Alias , entre outras peças como Orestéia , os dois já estiveram juntos no poético filme escrito e dirigido por Bete Dorgam para a TV Cultura , Fellini sobre as águas...
Assistir A Dócil e rever Palhaços, além de ter feito um bem para minha alma sempre carente de arte, foi novamente um aprendizado sobre teatro e o ofício do ator.
Dago, um beijo na sua alma, no seu coração, maior que o teatro, maior que o mundo e que como seu nome, você seja sempre FELIZ.
Eu tb sempre aprendendo com seu conhecimento e textos. Cool!
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