domingo, 10 de abril de 2011

O TRIÂNGULO COR DE ROSA


"A alma alheia é uma escuridão"F.Dostoeivski.

No domingo, 10 de abril de 2011,o suplemento Aliás, na última folha, traça o perfil de Rudolf Brazda de 98 anos,  último homossexual  que sobreviveu ao nazismo, e conta em livro o tempo que viveu no campo de concentração nazista de Buchenwald.
O livro de Rudolf se chama “O Triângulo Rosa”, referente a designação criada em alusão ao símbolo afixado nas roupas de 10 mil homossexuais deportados para campos de concentração durantes a 2° Guerra Mundial.
As leis que estabeleciam penas de prisão para homossexuais já se fazia latente na moral alemã, à rejeição era expressa no célebre artigo do código penal 175 que estabelecia “a luxuria contra o que é natural , realizada entre pessoas do sexo masculino ou entre homem e animal” como crime passível de prisão e de direitos civis. Assim, de encontro à ideologia do sistema, no combate aos judeus que eram uma ameaça à pureza da raça ariana, o combate aos homossexuais representava a suposta ameaça à perpetuação da raça.
Felizmente para Rudolf, ser gay,  era um complexo exercício de contradições entre algum grau de vergonha diante do olhar da sociedade e a necessidade de assumir sua diferença sem complexos. “O homossexualismo faz parte da vida porque faz parte da natureza.É a natureza que nos marca.Ou não se aceita, ou se aceita. Eu me aceitei .E dessa forma fui feliz”.
Assim, Rudolf, consegui expor sua sexualidade e vivê-la sem constrangimento, inclusive com aceitação por parte de sua família.Aceitação tal, que chegou a “oficializar” sua relação com Werner , seu primeiro amor.
Quando aconteceu a mudança entre a liberdade e a repressão , à partir de 1936, o cenário de tolerância começou a se inverter. Em 1937, numa manhã de abril, como hoje, Brazda foi acordado por uma revista policial em seu quarto.Ao assinar, obrigado um depoimento pleno de contradições, iniciou seu martírio de prisões até ser transferido em 1942 para o campo de concentração de Buchenwald, onde viveu o horror, a miséria e as experiências científicas em cobaias humanas.
 “Eu sabia que o homossexualismo era reprimido pelos nazistas. Mas jamais imaginei que eu mesmo fosse vítima de um crime contra a humanidade”.
Numa semana precedida por ataques de homofobia e racismo pelo deputado federal Bolsonaro. Pela humilhação do jogador de vôlei Michael, alvo de homofobia , pelo coro da torcida adversária. O perfil corajoso de Rudolf Brazda, o ato de coragem de Marcelo Tás, ao exibir com orgulho a foto de sua filha gay é algum respiro neste retrocesso que se vê pelo mundo.
No mesmo suplemento Aliás , e em outros jornais e revistas psicanalistas tentam encontrar uma explicação para o ato cruel de Wellington Menezes de Oliveira, que assassinou “friamente” crianças na escola onde estudou e deixou uma carta testamento confusa, cheia de angústia de uma pessoa que não consegui lidar com suas poderosas fantasias incestuosas, das quais talvez o rapaz tivesse apenas algum vislumbre consciente.
A reconstrução dos processos psíquicos, segundo o psicanalista Renato Mezan, que levaram Wellington a um crime tão hediondo, são apenas conjetural, para tentar explicar o inexplicável, e ajudar –nos a compreender .
Uma vez ,que mesmo a explicação se certa, não pode trazer de volta as vítimas de sua loucura.
Assim , o horror que nos assaltou ao tomarmos conhecimento do que ele estava fazendo, mostra mais do que compaixão pelas vítimas: penso que se deve ao receio de, por termos sido na infância pequenos Édipos, um dia nos vermos , atirando em inocentes depositários das nossas angústias.
Embora (se formos “neuróticos normais”) não precisemos recorrer às mesmas defesas psicóticas que esse moço teve de mobilizar.No fundo somos tão humanos quanto ele – e o desfecho trágico da sua loucura deve nos fazer pensar na nossa própria violência, que por se exercer por meios mais sutis não deixa de ter semelhança com a dele.
Tenho um amigo inglês, homossexual, que há 5 anos se apaixonou por um aluno. O aluno iria fazer 18 anos, que é considerado “ age of consent” a maioridade sexual. Segundo o meu amigo, seu aluno mentiu a idade. Ele não teve nada com o garoto, apenas se encontraram, pegarm na mão e se beijaram...O mesmo aluno fez chantagem e o denunciou.
 O meu amigo foi expulso da escola. Neste período ele morava com um companheiro , com o qual vivia uma relação estável de 10 anos , numa casa que herdou de sua família. O  beijo lhe custou a proibição de  lecionar na Inglaterra .Teve que vender a casa e dividir com seu parceiro.Sua história é quase o filme Notas sobre um escândalo(2006) de Richard Eyre com Cate Blanchett e Judi Dench.
No intuito de reconstruir sua vida.Ele mudou de país, por ser membro da comunidade européia, escolheu um país , em que já tinha morado, tinha amigos e falava a língua.
Teve um período de adaptação de cerca de 2 anos , no qual reaprendeu e aprimorou o idioma, trabalhou como garçom e aos poucos foi refazendo sua vida.
Tornou-se membro de um coral gay. Comprou um novo apartamento. Visitou outros países em férias... E logo, adquiriu os mesmos direitos e cidadania, tornando-se professor de literatura inglesa de uma escola.
Hoje, na mesma manhã ensolarada de abril , cinco anos depois. ..Assim que acabei de ler o acima escrito, recebo a notícia de que este meu amigo, está muito deprimido.Vivendo às custas de anti-depressivos e afins, além do álcool. Às vezes com idéias suicidas. Vive repetindo que se pudesse escolher , jamais seria gay. Expõe sua culpa e diz que sua vida teria sido mais fácil se tivesse uma família estruturada e com filhos.Sente-se culpado em frequentar ambientes gays e de ter sexo com desconhecidos , entre outros fatos e histórias que o desagradam no mundo gay.
Ele fala , fala ,fala... se repete, e finalmente diz que está apaixonado por Nike , seu aluno de 19 anos.

Fontes:Suplemento Aliás de 11 de abril de 2011.
 

Um comentário:

  1. O livro mencionado deve ser bem interessante. Li e vi o filme Notas sobre um Escândalo. Achei a discussão muito interessante (Judy Dench está ótima...ser ou não ser?).
    Quanto ao cenário nacional: (a) Bolsonaro pode ter feito um favor à causa gay. Agora vai ou racha. No mínimo deu visibilidade ao assunto e obrigou defensores dessa minoria a se manifestar mais assertivamente; (b) o atirador: aconteceu em outras partes do mundo, e com tantas violências que já temos por aqui (contra a mulher, e.g., que mata, mutila todos os dias)tomara que esta não se agregue. Aliás, com tanta facilidade para se obter armas pelo país, nem sei como isso não aconteceu antes independentemente das causas psicológicas, sociais, etc. Espero que, para o bem de todos nós, seja o primeiro e único episódio pela terra brasilis.

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