segunda-feira, 24 de agosto de 2015

A TEMPESTADE DE GABRIEL VILLELA

A Tempestade de Gabriel Villela


Há peças e peças, há diretores e diretores e há Shakespeare.
 “A tempestade”, de Shakespeare, é uma obra complexa, em que aparecem vários dos temas favoritos do autor, como aparência e realidade, a presença constante do mal, o bom governo, e em particular o confronto entre o natural e o cultivado, tudo envolto em uma forma de romance aventura e componentes de contos de fadas .
 A trama é armada em torno da usurpação do ducado de Milão por Antônio, com o duque banido, Próspero e sua filha Miranda, vivendo havia doze anos em uma ilha, onde é servido por Ariel, um espiríto alegre e hábil , e tendo para os serviços pesados Caliban, um canibal domesticado que aprendeu a falar.
Uma tempestade mágica traz à ilha , Antônio, o rei de Nápoles, que o ajudou na usurpação, e o filho deste, Ferdinando. Tendo afinal nas mãos os antigos desafetos, como nos outros romances da fase final do autor, os filhos como instrumentos para a paz entre os pais; e Próspero, a fim de voltar a Milão como duque , renuncia a magia, para governar sem recursos que não sejam humanos . ( Barbara Heliodora).
A  peça tem por  título um dos símbolos mais recorrentes no universo shakespeariano, seu enredo é a superação do conflito trágico que movia as peças anteriores , o personagem de Próspero compartilha muitos elementos que o assemelham ao próprio  autor, o epílogo trata da metalinguagem e da criação poética.
A Tempestade pode ser considerado o testamento artístico do autor. É possível ver em A tempestade uma bela reflexão e homenagem à imaginação, criatividade e ao fazer artístico. Há nela um velado otimismo e um tom sereno, que nos permite vislumbrar a complexa relação do artista e sua arte.
Para Harold Bloom, a capacidade de Próspero  de governar e manipular todos em sua ilha, o torna semelhante a um diretor de teatro, uma analogia à encenação onde o palco seria a ilha. Próspero, possivelmente inspirado no Fausto de Marlowe, pode ser o autor ou o diretor Gabriel Villela.
A encenação de Gabriel Villela, como a peça, traz várias pinceladas de sua trajetória como artista. Eu que  o acompanho desde “Você vai ver o que você vai ver”, “Concilio do Amor””Vem buscar-me que ainda sou teu”, ‘Romeu e Julieta”, “A vida é sonho” , "Rua da amargura", "Ventania" e  todas as outras , vi sua Tempestade, como uma rememoração de seus trabalhos e uma homenagem ao teatro que o influenciou. Sua ilha-sertão é do tamanho do mundo. O sertão-ilha é dentro da gente.
Gabriel, que tem nome de santo, como o rei de Nápoles, começa nos embalando com a cantiga de marujos e sua tempestade é pura poesia, é lúdica e  azul e já nos faz querer sonhar...Com  Villa –Lobos já estamos encantados, e é só o começo. ..
Como o Próspero, ele desfila sua magia teatral e faz homenagem ao teatro que o influenciou.
Temos um Caliban de Hélio Cicero, canibal, que chega com a deusa dos mares, e têm os pés presos no barro dos potes de Minas. É genial!Hélio Cícero num russo-antunes canta o tema de Romeu e Julieta do Zeffirelli, é uma ”Nova velha história”.
Ferdinando  é um Nijisnky do Naum. Ferdinando (Marco Furlan)e Miranda ( Leticia  Medella) são Romeu e Julieta de Gabriel.
Os sons e a música da ilha de Gabriel são únicos. O Ariel de Chico Carvalho é um vaga-lume lanterneiro que risca psius de luzes. O Próspero de Celso Frateschi é imaculado. Como disseram para o Paulo Autran quando o mesmo representou Próspero, cabe aqui; agora falta O Lear.
“Representar é aprender a viver além dos levianos sentimentos, na verdadeira dignidade”, nada mais mineiro para os atores e suas vozes veludas, veludosas vozes nos potes de Minas. O eco grave das cavernas.O mistério.
Tudo é tão mineiro , tão sagrado, tão universal, tão teatral!
 Dagoberto Feliz (Trínculo), Romis Ferreira (Estéfano) ,Leonardo Ventura (Alonso), Rogério Romera (Antônio), Felipe Brum (Sebastian) e Rodrigo Audi (Francisco) completam a família mineira em perfeita sintonia e harmonia. Como diria Barbara Heliodora, estão todos preparados para o texto em que a palavra é crucial, e exige um clima tão poético e imaginativo como a própria tempestade.
Os músicos atores, Celso Frateschi na flauta, Dagoberto Feliz  no piano e no acordeon e Chico Carvalho no violino.
Gabriel Villela no seu tutu mineiro, mistura Pena Branca e Xavantinho e Shakespeare e fica lindo, sublime.
A direção musical e preparação vocal é de Babaya. A iluminação de Wagner Freire é a água que rodeia a ilha. Os figurinos como sempre é uma obra de arte; os bordados,  composições que mesclam cores, crochês, teares, rendas... Os adereços e objetos de arte de Shicó do Mamulengo.
Gabriel Villela em sua Tempestade dá a exata dimensão que deve ter Próspero e sua trajetória do desejo de vingança para o perdão , e a aceitação de sua condição humana e de governante responsável.
Shakespeare sabe que a ambição é parte do homem e que jamais estaremos livres de nós mesmos.
Gabriel nos dá o Ouro de Minas. Na coroa do Rei, o Bardo. O prazer da Arte.
Despertamos do sonho da Tempestade de Gabriel Villela e em mares calmos embarcamos  com os atores na Jangada de Caymmi. De alma nova,  os óio se enche d’água que até a vista  se atrapaia....


A Tempestade de Willian Shakespeare
Tradução Marcos Daud
Direção Gabriel Villela
Elenco: Celso Frateschi, Helio Cicero, Chico Carvalho, Letícia Medella,
Marco Furlan, Dagoberto Feliz, Romis Ferreira, Leonardo Ventura, Rogério Romera, Felipe Brum, Rodrigo Audi
Teatro Tucarena
Sextas, sábados e domingos

Texto e fotos : Fabricio Matheus
Foto1: João Caldas






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